Um mover de olhos, brando e piedoso,
Sem ver de quê; um riso brando e honesto,
Quase forçado; um doce e humilde gesto,
De qualquer alegria duvidoso;
Um despejo quieto e vergonhoso;
Um repouso gravíssimo e modesto;
Uma pura bondade, manifesto
Indício da alma, limpo e gracioso;
Um encolhido ousar; uma brandura;
Um medo sem ter culpa; um ar sereno;
Um longo e obediente sofrimento;
Esta foi a celeste formosura
Da minha Circe, e o mágico veneno
Que pôde transformar meu pensamento.
3 comentários:
Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão
Porque os outros têm medo mas tu não
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.
E assim digo-lhe:
Se eu soubesse a palavra,
a que subjaz aos milhões das que já disse,
a que às vezes se me anuncia num súbito silêncio interior,
a que se inscreve entre as estrelas contempladas pela noite,
a que estremece no fundo de uma angústia sem razão,
a que sinto na presença oblíqua de alguém que não está,
a que assoma ao olhar de uma criança que pela primeira vez interrogou,
a que inaudível se entreouve numa praia deserta no começo do Outono,
a que está antes de uma grande Lua nascer,
a que está atrás de uma porta entreaberta onde não há ninguém,
a que está no olhar de um cão que nos fita a compreender,
a que está numa erva de um caminho onde ninguém passa,
a que está num astro morto onde ninguém foi,
a que está numa pedra quando a olho a sós,
a que está numa cisterna quando me debruço à sua borda,
a que está numa manhã quando ainda nem as aves acordaram,
a que está entre as palavras e não foi nunca uma palavra,
a que está no último olhar de um moribundo, e a vida e o que nela foi fica a uma distância infinita,
a que está no olhar de um cego quando nos fita e resvala por nós,
Se eu soubesse a palavra,
a única, a última,
e pudesse depois ficar em silêncio para sempre...
... Para sempre é muito tempo, mas será verdade que tudo tem fim?
Não, creio que seja mentira, pois o universo é infinito.
É verdade?
Claro que é mentira!
A verdade nos inspira a mentir
A mentira nos impõe o sorrir
É mentira?
Claro que é verdade!
O sentido não faz sentido.
Nascer sem ter morrido.
É verdade?
Claro que é mentira!
Acordar sem ter dormido.
E falar sem ser ouvido.
É mentira?
Claro que é verdade!
Andar desprotegido Sem ter receio do bandido.
É verdade?
Claro que é mentira! Correr livre do pecado.
Fazer o certo sendo errado.
É mentira?
Claro que é verdade!
Você é capaz de tudo.
Mas, creia eu te iludo.
Se é verdade ou mentira
Pouco nos importa
A verdade é falsa
Quando a mentira é verdadeira
A mentira é verdade
Quando a verdade é besteira
... Tem-se o duvidoso como argumento, esse se equilibra na piedade e na tristeza, que reside e não sai, que não vai... E por vontade própria, como se tivesse feito um honroso pacto com ela, por ela e para ela. Pedaços de fracassos remontados em outros pedaços. Esperança de ter a certeza de não saber os motivos da loucura, da insanidade e por vaidade exclui a lógica, desafiando destinos e presentes como se não houvesse o amanhã e nem a eternidade.
Mesmo com lágrimas nos olhos e remorso no coração, sabe que a vida está passando e a felicidade sumindo, desaparecendo como um encanto, como um castigo ou como uma maldição, sim maldição que destruiu e ainda destrói a noção, sim a noção que se tem quando existe realidade plena que desafia o equilíbrio e explode o coração.
Sentiu os anos passarem como um cometa, como um raio num dia feio de tempestade, tormenta e desatino. Passando sim pelo esquecimento, pelo vazio, pelo irreal e pelo frio calabouço que envolve um velho destino com o manto negro da insensatez, sim insensatez que desapropria a Alma da vida e mostra sempre o tamanho da ferida.
Escutando os sons do silêncio, as musicas que marcam para um todo sempre e trazem a tristura, a melancolia, entristecimento, desalento e desolação. Como lâmina afiada, destrói a sensação, sim a sensação do imaginário, do irreal que palmilha nas alamedas da memória, enganando a Alma com tolices, duvidas, desconsolo e insatisfação.
Assim chama, clama pelo Esconjurador, que pode exorcizar o exílio, a solitude, transformando em forças as energias adormecidas e esquecidas que jazem no cemitério da coragem, do esquecimento e do fracasso. Penas, martírios, piedades, recheadas de vontade, de superação, reconhecendo os sentidos, os sentimentos e as formas de luta, de combate à insatisfação. Com esperança, dignidade e magnitude, se entrega aos desejos, aos caprichos, as loucuras e com novas fontes de energia adquiridas, se engrandece perante a perda do passado e busca o presente que ofusca o futuro e desafia, sim desafia todas as formas de racionalidade.
No fim do dia, no leito, bem no escuro, na hora da reflexão, a maldita sensação de não ter feito a coisa certa, de não ter falado as palavras corretas, por ter desperdiçado precioso tempo com irritação, soturnidade, esmorecimento e prostração. Novamente triste, novamente duvidando da realidade, da felicidade e assumindo que para o amanhã será outra realidade, terá sempre a verdade, mesmo que desafie a mentira com severidade.
A sensação de alívio por ter exposto a vida em palavras como um conto, um poema, sem saber se irá causar o efeito da maturidade. Mas somente tendo uma certeza plena, que quando adormecer e acordar, acordará também para mais um dia, sim um novo dia com novos desafios em tornar cada vez mais o amor uma arma letal, sim, letal, mas somente para quem desejar se colocar entre a sua verdade e sua felicidade...!
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